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domingo, 20 de março de 2011

Paulo testifica de Cristo em Roma - Parte 4

O Naufrágio (Atos 27:27-44)
27:27 / Por volta da meia-noite na décima quarta noite após terem
saído de Bons Portos (alguns dizem de Clauda) os marinheiros detectaram
sinais de terra próxima. É possível que tenham ouvido as ondas quebrandose
na praia, sugestão que tem o apoio do Codex Vaticanus que, em vez de
"estavam próximos de terra" (como diz a maioria dos textos) traz
"ressoando". A tradição, como regra, para procurar identificar um local
bíblico, é inconfiável. Neste caso, todavia, temos todas as razões para achar
que os navegantes chegaram, conforme diz a tradição, à baía de São Paulo, na
ilha de Malta. Se assim foi, o navio teria passado dentro de um raio de
quatrocentos metros de Ponto Koura, a leste dessa baía e, embora a terra aqui
seja demasiado baixa para ser vista numa noite escura e tempestuosa, as
ondas que se quebram podem ser ouvidas a alguma distância. Tanto o lugar
como o tempo exigido para alcançar essa baía (uma distância de 475
milhas marítimas a partir de Bons Portos) parecem confirmados pelos
cálculos de Smith. Presumindo-se a direção do vento (ENE) e a
velocidade média de derivação de um navio grande costeando a estibordo
(aproximadamente um pouco mais de três quilômetros por hora), concluiu
ele que "um navio, fazendo-se ao mar ao entardecer... ao redor da meianoite
do décimo-quarto dia estaria a menos de cinco quilômetros da entrada
da baía de São Paulo" (pp. 120-24).
27-28 / As suspeitas dos marinheiros se confirmaram quando eles
lançaram a sonda e acharam vinte braças (trinta e cinco metros) de
profundidade. Estas correspondem bem às medidas tomadas no Ponto
Koura, próximo da baía de São Paulo. O homem que lançava a sonda estaria
gritando as medidas, de tal forma que Lucas e o timoneiro podiam ouvi-las.
27:29 / A proximidade de terra exigia medidas de segurança, pelo que
lançaram da popa quatro âncoras para evitar que dessem de encontro às
rochas, e ficaram aguardando o amanhecer. Tais âncoras eram relativamente
leves, segundo os padrões modernos, por isto esse número (quatro) era
necessário. Lançar âncoras da popa não era comum, mas lançá-las da proa
teria feito o navio girar pela força do vento e, sem saber a que distância da
praia estavam, os marinheiros teriam ficado em dúvida quanto a se poderiam
fazê-lo voltar à posição normal, e fazê-lo fundear pela manhã.
27:30 / Mas a tripulação, ou pelo menos alguns tripulantes — não
sabemos quantos homens compunham a tripulação, nem o tamanho do barco
— não teve calma para esperar o amanhecer. Para eles, que "cada um
cuidasse de si próprio", e fingindo que eram necessárias mais algumas
âncoras da proa para ajudar a estabilizar o navio, e que precisavam lançá-las
na extremidade do cabo em vez de atirá-las do convés, colocaram o bote na
água a fim de escapar. O que pretendiam fazer na escuridão da noite, numa
praia desconhecida, parece-nos o cúmulo da imprudência, sendo isto tudo
que se poderia dizer a respeito. Qualquer pessoa ajuizada teria considerado o
próprio navio, muito maior, bem mais seguro, pelo menos até o amanhecer.
Por outro lado, é possível que desejassem sinceramente lançar mais âncoras,
e que a intenção deles havia sido mal interpretada pelos passageiros.
27:31-32 / Seja como for, Paulo apelou para o instinto de
autopreservação dos marinheiros (não podereis salvar-vos, v. 31), e insistiu
em que os homens ficassem a bordo. O centurião reagiu imediatamente —
talvez tenha exagerado na reação — e fez que seus soldados cortassem as
cordas que prendiam o barco. O resultado foi que o barco, que poderia ser útil
quando todos finalmente viessem a abandonar o navio, se perdeu, mas o fato
importante é que os marinheiros foram retidos (na suposição de que
pretendiam fugir), e puderam ajudar a colocar o barco mais perto da praia,
pois de outra forma os passageiros poderiam estar condenados à morte. Por
toda a narrativa verifica-se um lindo equilíbrio entre a certeza do cuidado
de Deus quanto à segurança de todos, e os esforços das pessoas para
assegurá-la. Observe a autoridade com que Paulo agiu nesta situação, e
também nos demais versículos.
27:33-34 / Estando amanhecendo agora, Paulo exortava a todos a
que comessem alguma coisa (v. 33). O tempo todo haviam sido acossados
pelo vento terrível, e atirados de lá para cá pelas ondas, desde Creta a este
lugar (cp. Efésios 4:14), sem comer (v. 33). Diz o grego literalmente, "nada
haviam tomado". Nos navios da época não havia mesas postas, nem
garções para servir as refeições. A pessoa que quisesse comer deveria ir
buscar a comida na cozinha do navio. Assim, é possível que Paulo quisesse
dizer que as pessoas não haviam ido buscar suas rações regulares — ou
porque haviam perdido o apetite completamente, ou porque a cozinha não
pudera funcionar durante a tempestade. Talvez as pessoas houvessem
subsistido com algum alimento que tinham à mão, ou simplesmente haviam
jejuado o tempo todo. Fosse como fosse, Paulo agora exortava a todos a que
comessem. Iriam precisar de toda a sua energia, se quisessem chegar à
praia. O apóstolo era um homem de fé prática (veja a disc. sobre os vv.
31s.). De novo ele lhes assegurou que estariam salvos, empregando agora o
que deveria ser um provérbio na época, nem um cabelo cairá da cabeça de
qualquer de vós (v. 34; cp. 1 Samuel 14:45; 2 Samuel 14:11, RSV; 1 Reis
1:52; Mateus 10:30; Lucas 21:18).
27:35-36 / Paulo acrescenta a essa exortação seu próprio exemplo; ao
tomar um pouco de pão, deu graças a Deus (v. 35), partiu-o e pôs-se a
comê-lo. O fato de o apóstolo haver dado graças a Deus talvez indique
apenas o costume judeu e cristão de dar "graças" às refeições, e essa teria sido
uma refeição comum. Entretanto, a descrição é tão parecida com várias
outras descrições de refeições presididas por Jesus, e de modo especial
aquela Última Ceia (cp. Lucas 9:16; 22:19; 24:30), que às vezes há quem diga
que esta refeição foi "um ritual da comunhão" para dois ou três cristãos a
bordo. Isto pode ser questionado, mas a ação de Paulo produziu o efeito
desejado: Todos cobraram ânimo, e se puseram também a comer (v. 36).
27:37 / Lucas dá o número de pessoas a bordo: duzentas e setenta e
seis. Isto às vezes surpreende os modernos leitores, levando-os a aceitar o
número mais modesto de setenta e seis, que se encontra em alguns textos.
Todavia, o número maior não apresenta maiores dificuldades. Muitos navios
cerealistas alexandrinos de fato eram enormes. Josefo, que também havia
naufragado um dia nessas águas (mar Adriático; veja a nota sobre o v. 27),
foi um passageiro dentre outras seiscentas pessoas, mais ou menos, a bordo
de um navio (Life 3). Lucas talvez houvesse mencionado esse número,
nessa conjuntura, porque a distribuição de víveres lhe havia chamado a
atenção. Mas a maravilha real é que todos se salvaram. No caso de Josefo,
apenas oitenta das seiscentas pessoas sobreviveram.
27:38 / Depois começaram (talvez só a tripulação) a aliviar o navio,
alijando o trigo ao mar. Outras cargas já haviam sido atiradas à água (v.
18), mas o trigo havia sido preservado até agora, em parte como lastro e em
parte na esperança, talvez, de poder ser salvo. O trigo sempre havia sido
muito caro em Roma. O propósito daqueles homens era tornar o navio mais
leve (carregado, ficaria mais seis metros dentro da água), e assim poder
aproximar-se mais da praia.
27:39 / Quando finalmente havia luz suficiente, nem assim os marinheiros
puderam reconhecer o lugar onde estavam, mas o que mais
importava no momento foi que viram uma enseada com uma praia. É
possível que houvessem freqüentemente aportado em Malta (cp. 28:1), mas
a baía de São Paulo é muito longe do principal porto, e não podia ser
reconhecida por alguma característica distinta. O tempo imperfeito dá-nos o
sentido de "tentaram reconhecer o lugar... mas não puderam". Em 28:1 temos
o mesmo verbo, mas no tempo aoristo, indicando que houve pronto
reconhecimento ao desembarcar.
27:40 / Na esperança de fundear o navio na areia (sendo seu objetivo
salvar as pessoas, não o navio), os marinheiros lançaram âncoras da popa e
soltaram também as amarras do leme —dois remos, um de cada lado. Tais
remos haviam sido levantados acima da água e amarrados, estando o navio
preso pelas âncoras. Ao mesmo tempo, a vela da proa (o significado da
palavra grega é duvidoso, mas este seria seu sentido aqui; veja a disc. sobre o
v. 17), que havia sido arriada antes do anoitecer, foi içada de novo para dar
direção ao navio e, assim, dirigiram-se à praia.
27:41 / Mas o navio deu num banco de areia (lit., "lugar de dois
mares"), onde ficou encalhado. Tendo vento forte por trás, não havia jeito de
safá-lo dali, especialmente pelo fato de a baía de São Paulo ter "um fundo de
lodo, sobreposto em argila dura, em que a parte dianteira, ou a proa, teria
batido com força, enquanto a popa ficara exposta à fúria das ondas"(Ramsay,
Paul, p. 341). Smith sugere que isto aconteceu no canal, a não mais que
duzentos e cinqüenta metros entre a ilhota de Salmoneta e o continente. Este
estreito poderia ser descrito apropriadamente "lugar onde dois mares se
encontram", porque une o mar dentro da baía com o mar ao longe. Um local
mais comumente aceito, entretanto, é o banco de areia chamado São Paulo,
que fica à entrada da baía, o qual era mais elevado em tempos antigos. O
choque da proa contra o fundo do mar, mais os impactos das ondas, teriam
despedaçado a popa. Na verdade, alguns textos omitem a referência às
ondas, e assim dão esse sentido ao versículo. O tempo imperfeito podia levar
a esta interpretação: "começou a arrebentar-se".
27:42-44 / Estando o navio condenado, os soldados eram de opinião
que todos os prisioneiros fossem mortos antes que algum dentre eles
escapasse e eles fossem responsabilizados (cp. 12:19; 16:27). Todavia,
querendo salvar a Paulo, o centurião estorvou-lhes este intento (v. 43) —a
palavra "salvar" significa conduzir em segurança no meio do perigo. Portanto,
ele deu ordens para que todos procurassem chegar à praia da melhor maneira
que pudessem — os que soubessem nadar, que partissem imediatamente.
Paulo poderia estar incluído aqui, visto ter sobrevivido a três naufrágios e ter
passado uma noite no mar (2 Coríntios 11:25). Os que não soubessem nadar
deveriam agarrar-se a tábuas e outros em destroços do navio (v. 44). A
última frase todavia poderia ser traduzida assim: "às costas dos membros da
tripulação". Assim foi que desta ou daquela maneira todos chegaram à
terra salvos (v. 44; cp. vv. 22, 34).


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